Novembro 25, 2024
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‘Remédio’ do Banco Central ajuda especuladores, mas não segura inflação

O presidente do Banco Central (BC), Roberto Campos Neto, afirmou nesta segunda-feira (11) que ficou “surpreso” com a inflação no mês passado. Ele esperava conter os preços, após a nona alta seguida da Selic (taxa básica de juros) pelo Comitê de Política Monetária (Copom). No entanto, a inflação de março, medida pelo Índice Nacional de Preços ao Consumidor (IPCA), subiu 1,62%, a maior para o mês desde 1994. Em 12 meses, o IPCA acumula alta de 11,30%. Desse modo, com a taxa básica (Selic) definida em 11,75%, o ganho real médio de quem empresta ao governo está em 0,45 ponto percentual ao ano.

Ainda assim, Campos Neto disse acreditar que os juros altos ainda farão cair a inflação “nos próximos trimestres”. No entanto, economistas como o professor José Luis Oreiro, do Departamento de Economia da Universidade de Brasília (UnB), avaliam que o BC erra no diagnóstico. E, portanto, “está aplicando o remédio errado” contra a inflação. À reportagem da RBA, ele afirmou que a alta dos preços no país não está relacionada a pressões “de demanda” – quando a procura por produtos e serviços é maior que a disponibilidade imediata –, que poderia ser corrigida com aumento dos juros.

banco central erra no remédio
Bolsonaro e seu possível vice na futura chapa presidencial, general Braga Netto: remédio superfaturado contra queda de cabelo e outras, em vez de tratamento eficaz para inflação (Allan Santos/PR)

 

Mais do que isso, Oreiro diz que esse remédio vai custar caro ao Brasil. Inclusive, mais caro do que os viagras e antiquedas de cabelo adquiridos pelas Forças Armadas com preços superfaturados. De acordo com seus cálculos, toda vez que o Banco Central eleva a Selic em 1 ponto percentual, os gastos anualizados com o pagamento de juros da dívida aumentam em R$ 36 bilhões. Nesse sentido, a alta da taxa básica de juros também encarece o crédito para empresas e famílias, dificultando ainda mais a recuperação dos endividados.

Mas nem todo mundo sai perdendo. Além dos investidores, que passaram a ganhar um pouco mais com títulos públicos, os bancos passaram a cobrar muito mais por operações de crédito. Por isso celebram lucros recordes, como sempre.

Causas

“A política de elevação de juros é contraproducente. Ou seja, ela não tem efeito sobre a inflação. O BC subir os juros não vai afetar em nada o preço das commodities no mercado internacional”, disse o economista, referindo-se especialmente ao petróleo. “Quem se beneficia é o setor financeiro, os rentistas em geral. Quem se prejudica é o setor empresarial produtivo, assim como quem tem dívida atrelada à Selic.”

Como causas da recente escalada nos preços, principalmente dos alimentos e dos combustíveis, Oreiro cita as consequências da pandemia de covid-19, que desorganizou cadeias locais e globais importantes de valor. Soma-se a isso a guerra na Ucrânia, assim como as sanções econômicas aplicadas pelos Estados Unidos e pela Europa contra a Rússia.

“O que está acontecendo no Brasil não é diferente, de forma qualitativa, do que está acontecendo, por exemplo, nos Estados Unidos. Quer dizer, nos Estados Unidos a inflação acumulada em 12 meses está em 8%. Na Espanha ela está próxima de 10%”, afirmou.

A diferença, segundo ele, foi o tratamento adotado pelo Brasil para conter a doença. “Esse tipo de inflação você não combate com a elevação dos juros.” Oreiro destacou que o Banco Central Europeu (BCE) manteve a taxa básica em -0,5% ao ano. Já o Federal Reserve (Fed), Banco Central dos Estados Unidos, aumentou em apenas 0,25 ponto percentual no mês passado. No entanto, no mesmo dia, o BC do Brasil anunciava elevação de 1 ponto percentual, com a Selic fixada em 11,75% ao ano.

Nem sequer a atual apreciação do real frente ao dólar Oreiro atribui à elevação da Selic. “O câmbio no Brasil só caiu abaixo de R$ 5 depois da guerra na Ucrânia. O BC vem aumentando a taxa de juros desde março do ano passado”.

Tratamento alternativo

A valorização do real, segundo ele, tem a ver com a alta dos preços das commodities no mercado internacional. Ainda assim, essa variação não foi capaz de garantir alívio no mercado interno. “Na verdade, o preço das commodities, principalmente dos alimentos e da energia, subiu mais em dólares do que o dólar se desvalorizou frente ao real. Por isso que a pressão inflacionária não foi eliminada”, afirmou.

Para conter a alta dos preços no Brasil, em vez da elevação da Selic, Oreiro afirma que a solução para conter a inflação, nesse momento, não passa pela política monetária. Para isso, ele diz que o instrumento mais adequado seria um imposto de exportação sobre as commodities produzidas no Brasil, como soja e milho, por exemplo.

“O que nós deveríamos ter feito pra segurar um pouco a inflação de alimentos no Brasil seria introduzir um imposto sobre a exportação de commodities“, sugeriu. Assim, segundo ele, a receita trazida por essa taxação serviria para redirecionar a produção de alimentos para o mercado interno, fazendo cair os preços.

Fonte: Rede Brasil Atual