O presidente do Banco Central (BC), Roberto Campos Neto, afirmou nesta segunda-feira (11) que ficou “surpreso” com a inflação no mês passado. Ele esperava conter os preços, após a nona alta seguida da Selic (taxa básica de juros) pelo Comitê de Política Monetária (Copom). No entanto, a inflação de março, medida pelo Índice Nacional de Preços ao Consumidor (IPCA), subiu 1,62%, a maior para o mês desde 1994. Em 12 meses, o IPCA acumula alta de 11,30%. Desse modo, com a taxa básica (Selic) definida em 11,75%, o ganho real médio de quem empresta ao governo está em 0,45 ponto percentual ao ano.
Ainda assim, Campos Neto disse acreditar que os juros altos ainda farão cair a inflação “nos próximos trimestres”. No entanto, economistas como o professor José Luis Oreiro, do Departamento de Economia da Universidade de Brasília (UnB), avaliam que o BC erra no diagnóstico. E, portanto, “está aplicando o remédio errado” contra a inflação. À reportagem da RBA, ele afirmou que a alta dos preços no país não está relacionada a pressões “de demanda” – quando a procura por produtos e serviços é maior que a disponibilidade imediata –, que poderia ser corrigida com aumento dos juros.
Mais do que isso, Oreiro diz que esse remédio vai custar caro ao Brasil. Inclusive, mais caro do que os viagras e antiquedas de cabelo adquiridos pelas Forças Armadas com preços superfaturados. De acordo com seus cálculos, toda vez que o Banco Central eleva a Selic em 1 ponto percentual, os gastos anualizados com o pagamento de juros da dívida aumentam em R$ 36 bilhões. Nesse sentido, a alta da taxa básica de juros também encarece o crédito para empresas e famílias, dificultando ainda mais a recuperação dos endividados.
“A política de elevação de juros é contraproducente. Ou seja, ela não tem efeito sobre a inflação. O BC subir os juros não vai afetar em nada o preço das commodities no mercado internacional”, disse o economista, referindo-se especialmente ao petróleo. “Quem se beneficia é o setor financeiro, os rentistas em geral. Quem se prejudica é o setor empresarial produtivo, assim como quem tem dívida atrelada à Selic.”
Como causas da recente escalada nos preços, principalmente dos alimentos e dos combustíveis, Oreiro cita as consequências da pandemia de covid-19, que desorganizou cadeias locais e globais importantes de valor. Soma-se a isso a guerra na Ucrânia, assim como as sanções econômicas aplicadas pelos Estados Unidos e pela Europa contra a Rússia.
“O que está acontecendo no Brasil não é diferente, de forma qualitativa, do que está acontecendo, por exemplo, nos Estados Unidos. Quer dizer, nos Estados Unidos a inflação acumulada em 12 meses está em 8%. Na Espanha ela está próxima de 10%”, afirmou.
A diferença, segundo ele, foi o tratamento adotado pelo Brasil para conter a doença. “Esse tipo de inflação você não combate com a elevação dos juros.” Oreiro destacou que o Banco Central Europeu (BCE) manteve a taxa básica em -0,5% ao ano. Já o Federal Reserve (Fed), Banco Central dos Estados Unidos, aumentou em apenas 0,25 ponto percentual no mês passado. No entanto, no mesmo dia, o BC do Brasil anunciava elevação de 1 ponto percentual, com a Selic fixada em 11,75% ao ano.
Nem sequer a atual apreciação do real frente ao dólar Oreiro atribui à elevação da Selic. “O câmbio no Brasil só caiu abaixo de R$ 5 depois da guerra na Ucrânia. O BC vem aumentando a taxa de juros desde março do ano passado”.
Tratamento alternativo
A valorização do real, segundo ele, tem a ver com a alta dos preços das commodities no mercado internacional. Ainda assim, essa variação não foi capaz de garantir alívio no mercado interno. “Na verdade, o preço das commodities, principalmente dos alimentos e da energia, subiu mais em dólares do que o dólar se desvalorizou frente ao real. Por isso que a pressão inflacionária não foi eliminada”, afirmou.
Para conter a alta dos preços no Brasil, em vez da elevação da Selic, Oreiro afirma que a solução para conter a inflação, nesse momento, não passa pela política monetária. Para isso, ele diz que o instrumento mais adequado seria um imposto de exportação sobre as commodities produzidas no Brasil, como soja e milho, por exemplo.
“O que nós deveríamos ter feito pra segurar um pouco a inflação de alimentos no Brasil seria introduzir um imposto sobre a exportação de commodities“, sugeriu. Assim, segundo ele, a receita trazida por essa taxação serviria para redirecionar a produção de alimentos para o mercado interno, fazendo cair os preços.