Desde 1º de janeiro, a síndrome de Burnout, também conhecida como síndrome do esgotamento profissional, passou a ser considerada doença ocupacional após ser incluída na Classificação Internacional de Doenças (CID) da Organização Mundial da Saúde (OMS). O reconhecimento assegura que o trabalhador diagnosticado com a síndrome poderá ter os mesmos direitos trabalhistas e previdenciários que outras doenças relacionadas ao emprego.
De acordo com pesquisa realizada pela Associação Internacional de Gerenciamento de Estresse (ISMA-BR), o Brasil é o segundo país com o maior número de pessoas afetadas pela síndrome de Burnout. Além de ter também a maior taxa de pessoas que sofrem com ansiedade e ser o quinto país em casos de depressão, conforme a OMS. No caso do esgotamento profissional, a psicóloga Renata Paparelli, professora da Pontifícia Universidade Católica de São Paulo (PUC-SP), explica que a síndrome de Burnout nada mais é que uma estafa proveniente do excesso de trabalho. De acordo com ela, o profissional se sente cansado, deprimido e sem vontade de continuar a trabalhar.
“A síndrome de Burnout pode ser entendida também como uma espécie desistência. (A pessoa) não consegue mais, ela sucumbiu na verdade. Muitas vezes essa síndrome se dá em pessoas que realizam trabalhos que exigem grandes vinculações ou engajamento. Isso pode ser um trabalho no qual a pessoa é tanto seduzida para bater metas abusivas, quanto um trabalho no setor de saúde, educação e assistência social”, explica. “As pessoas, em geral, falam de algo do tipo ‘uma chama que se apagou’, que ela tinha uma força que desapareceu.”
‘Perdi minha potência’
Vitor, que preferiu se identificar apenas pelo primeiro nome, confirma a análise da professora. Profissional da educação, ele conta que nesse período de pandemia sentiu que o peso do trabalho na escola nunca acabava. Vitor descreve ter atingido o ápice de seu esgotamento quando as aulas presenciais foram retomadas.
“Meu ambiente de trabalho é a escola que, principalmente nesse retorno na pandemia, foi algo muito pesado para a gente. Era muito trabalho e nunca dava tempo de fazer tudo. E aí levávamos o trabalho para casa, para fazer no final de semana e no feriado. Então nunca conseguíamos realmente se desconectar do trabalho e parecia que mesmo assim a gente estava sempre atrasado. Você não consegue dormir direito, dorme e acorda de madrugada, sempre cansado. Psicologicamente, emocionalmente e até fisicamente você começa a perder sua potência”, relata Vitor.
Apesar da sobrecarga profissional, o educador destaca que não houve apoio em seu trabalho e ele só conseguiu sair do esgotamento com ajuda psicológica. “Meu trabalho não me apoiou nessa situação. Simplesmente meio que faziam aquelas frases motivacionais de ‘vamos juntos’ e ‘vamos dar doce para comemorar’, mas não lidavam ou apoiavam realmente a situação. O que funcionou para mim foi ir atrás de uma terapeuta, conversar sobre isso e começar a internamente mudar a maneira como eu lido”, relembra.
Burnout entre bancários
Secretário de Saúde e Condições de Trabalho do Sindicato dos Bancários de São Paulo, Carlos Miguel Damarindo observa que entre a categoria é comum a síndrome de Burnout. Mas os bancos tratam a doença como “fachada”, inclusive tentando negar os laudos dos médicos, segundo o dirigente sindical.
“No caso dos bancários, a síndrome é bem comum entre os trabalhadores e trabalhadoras devido ao processo que é muito nítido na categoria de metas abusivas, uma forma de pressão, e isso acarreta o adoecimento. Na pandemia, isso foi escancarado”, aponta. “Tanto é que muitos dos bancos tentam negar os laudos dos médicos e assistentes dos bancários e existe dentro da convenção e dos acordos a previsão de reabilitação ou readaptação desses trabalhadores que adoecem para qualquer tipo de doença. Mas no caso da síndrome de Burnout, da depressão e da síndrome do pânico a gente vê uma fachada que os bancos fazem”, aponta.
“Muitos desses trabalhadores quando retornam do afastamento do INSS, ou estão em tratamento médico e tentando levar o trabalho sem ser afastado, ficam sempre no mesmo local onde adoeceram. E as empresas não têm normalmente esse costume de fazer uma avaliação porque eles não querem ser responsabilizadas”, completa.
Trabalhar não é para adoecer
Para a secretária de Saúde do Trabalhador da CUT, Madalena Margarida da Silva, é um avanço que a síndrome de Burnout seja considerada doença ocupacional. “Isso possibilita que os trabalhadores e trabalhadoras não tenham medo de expor o problema e lutem cada dia mais por seus direitos”, destaca.
O secretário de Saúde e Condições de Trabalho do Sindicato dos Bancários conclui que é preciso “quebrar a regra de que trabalhar é para adoecer”. “Isso não é comum, não podemos aceitar como normalidade. É um caminho que temos que construir coletivamente para quebrar a tal da normalidade sobre a doença do presente, que é a doença do futuro, dos transtornos mentais.”
Fonte: Rede Brasil Atual