Agosto 23, 2025
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Encontros Nacionais do Bradesco, Itaú e Santander se encerram com diversas resoluções e debates

Neste sexta-feira, 22 de agosto, a cidade de São Paulo sediou os encontros nacionais dos funcionários de bancos privados: Encontro Nacional dos Funcionários do Banco Itaú-Unibanco, Encontro Nacional dos Funcionários do Santander e Encontro Nacional dos Funcionários do Bradesco.

BRADESCO

Defesa do emprego, fim do fechamento de agências e melhorias no plano de saúde. Esses são alguns dos principais pontos da pauta de reivindicações específicas aprovada nesta sexta-feira (22), durante o Encontro Nacional dos Funcionários do Bradesco com o tema Futuro justo, sustentável, inclusivo e democrático, que reuniu cerca de 100 delegadas e delegados eleitos de todo o país, no hotel Holiday Inn, em São Paulo. Encontro antecede a 27ª Conferência Nacional dos Bancários que ocorre a partir da noite desta sexta 22 até domingo 24, em São Paulo.

Na análise de conjuntura logo no início dos debates, a presidenta da Confederação dos Trabalhadores do Ramo Financeiro (Contraf-CUT), Juvandia Moreira, destacou que o maior patrimônio do coletivo do Bradesco é a unidade para enfrentar fechamento de agências, demissões e os avanços tecnológicos com a Inteligência Artificial (IA) que ameaça o emprego do bancário.

“Manter o emprego é uma das nossas principais preocupações neste momento diante da reestruturação que o Bradesco vem realizando em todo o Brasil ao mesmo em que há o avanço da IA nas aplicações diárias que ameaçam o trabalho do bancário. Mas, também temos de olhar para as lutas em comum com a sociedade e puxar para nossa responsabilidade a defesa da soberania, da democracia e de mostrar que o movimento sindical é forte ao ponto de eleger representantes que possam barrar o avanço do fascismo e lutar contra a retirada de direitos, pelo fim da jornada 6×1”, disse Juvandia, que também é uma das coordenadoras do Comando Nacional dos Bancários e vice-presidenta da CUT.

Na mesma mesa, a presidenta do Sindicato dos Bancários de São Paulo, Osasco e Região e uma das coordenadoras do Comando Nacional dos Bancários, Neiva Ribeiro, também destacou que os bancários devem assumir a responsabilidade de disputar as narrativas e ajudar a formar redes de diálogo para espalhar as boas ações a fim de desmentir as fake news que surgem a todo o momento. “Estamos correndo risco na atual conjuntura que vivemos e o nosso papel e nossa responsabilidade enquanto movimento sindical é conversar com o bancário e a bancária lá no local de trabalho para enfrentar as demandas específicas, mas ao mesmo tempo, dialogar também com a sociedade e tentar traduzir a importância da defesa da soberania, da democracia e mostrar que, sem elas, nossos direitos enquanto sociedade civil não avançam, sem democracia não há negociação com o patrão e nem tem avanços na nossa Convenção Coletiva de Trabalho (CCT) dos bancários”.

Inteligência artificial: o futuro das finanças já chegou

No painel sobre conjuntura do Sistema Financeiro Nacional e perspectivas para o futuro, o professor doutor Moisés Marques afirma que o banco do futuro que se falava há 13 anos já chegou e relembrou que nos anos 1993 havia 30 grandes bancos no país e hoje, apenas dez instituições concentram a maior parte do mercado, mas já não são as únicas protagonistas. Fintechs como PicPay Original e Nubank transformaram a lógica do sistema financeiro, sendo o Nubank a instituição financeira de maior valor de mercado da América Latina, operando com custos muito menores do que os bancos tradicionais e com uma carteira de 123 milhões de clientes.

“O banco do futuro chegou e ganhou força com a inteligência artificial. E ela vem sendo usada pelos bancos com três principais finalidades que é aumentar produtividade e eficiência, ampliar receitas e negócios, e reforçar conformidade e gestão de risco. Mas, na prática, o cliente segue em último lugar. O foco está em fidelizar consumidores e ampliar a operabilidade, ao mesmo tempo em que crescem dilemas éticos: até onde vale substituir pessoas por tecnologia? Qual o limite da coleta e uso de dados pessoais?”, criticou o professor.

Ele ainda acrescentou que “por trás da promessa de inovação, o banco do futuro chegou, mas não é para todos. Para clientes e trabalhadores, a IA pode significar rebaixamento e homogeneização, colocando todos na mesma condição de vulnerabilidade a disputa, portanto, não é apenas tecnológica ou de mercado: trata-se também de como a sociedade vai lidar com privacidade, emprego e poder em um sistema financeiro cada vez mais concentrado e guiado por algoritmos, e não podemos aceitar sem lutar”, finalizou Moisés.

Plano de reestruturação

O economista e técnico da subseção do Dieese na Contraf-CUT, Gustavo Cavarzan, apresentou o Plano Estratégico do Bradesco, reestruturação que o banco colocou em prática após fortes quedas no lucro entre 2019 e 2020 e na rentabilidade de 2021 a 2023.

O plano, iniciado em 2024 e com conclusão prevista para 2028, prevê mudanças graduais a cada trimestre ao longo dos próximos cinco anos. O objetivo é recuperar os resultados e reposicionar a instituição.

Inclusive, o Bradesco fez mudanças estratégicas em sua diretoria, trazendo de fora executivos para ocuparem duas importantes vice-presidências: a de Negócios Digitais e a de Recursos Humanos.

Segundo Cavarzan, ainda faltam, três anos para a conclusão do plano do banco, mas o cenário caminha para que continue como foi traçado já que o banco vem recuperando seus patamares de lucro: o resultado do lucro líquido recorrente foi de R$ 11,9 bilhões, um crescimento de 33,7% em relação ao mesmo período do ano passado no primeiro trimestre de 2024 (de R$ 4,2 bilhões).

“Mesmo com lucro já estamos vendo a perda importante de postos de trabalho, intensificação das rotinas de trabalho com a IA e a melhoria na BIA sendo a primeira IA a ser usada por uma instituição financeira. A sugestão é que se faça um processo rígido de negociação e de fortalecimento da categoria para que lá em 2028, o movimento sindical não encontre um cenário de terra arrasada”, completou.

Para Erica de Oliveira, coordenadora da Comissão de Organização dos Empregados (COE), esse é um momento importante em que há possibilidade de debater e ouvir as demandas dos bancários do Bradesco em todas as regiões e de definir como traçar as questões que são viáveis de serem levadas a debates a nível nacional. “Foi um dia muito rico de debate e interação com os colegas, os bancários do Bradesco das diversas federações ajudaram muito e foram responsáveis por esse belo encontro. Estamos muito satisfeitos e vamos juntos ampliar esses debates no âmbito da Conferência Nacional, foi um dia muito bacana para todos nós”, finalizou.

Plano de luta e ação

Como plano de luta, no final do encontro, os participantes definiram uma grande campanha de mídia que irão discutir e debater nas próximas semanas no âmbito da COE, já no plano de ação, a defesa do emprego, pelo fim do fechamento de agências, melhorias no plano de saúde do Bradesco, valorização dos últimos acordos relacionados à CCV e PPR que terão assembleias nas próximas semanas.

SANTANDER

Delegados e delegadas de todo o País estiveram reunidos, nesta sexta-feira (22), em São Paulo, para o Encontro Nacional dos Funcionários do Santander. Após um dia todo de debates, que incluiu análises de conjuntura e destaques dos dados e do balanço do banco, os participantes relembraram como foram as negociações no ano passado do Acordo Coletivo de Trabalho (ACT) específico, com validade até 31 de agosto de 2026.

“É importante relembrarmos e destacarmos as conquistas nas cláusulas sociais e econômicas obtidas na Campanha Nacional 2024, que constam no ACT específico do Santander e garantem direitos a todos os trabalhadores do banco até o ano que vem”, ressaltou Wanessa de Queiroz, coordenadora da Comissão de Organização dos Empregados (COE) do Santander.

No encontro, também foram debatidas as atividades mobilização, organização e enfrentamento que já foram realizadas nas bases das federações e as ações que ainda são necessárias. “Ao debatermos a grande campanha nacional que já está em curso, em defesa do emprego bancário e denunciando as fraudes de contratação praticadas pelo Santander com as terceirizações, atualizamos o andamento das ações jurídicas e sindicais, bem como sobre as audiências públicas realizadas em todo País”, complementou Wanessa. Por fim, as propostas de plano de lutas debatidas nos Encontros Regionais e Estaduais foram remetidas para a COE/Santander pautar as próximas negociações.

Rita Berlofa, secretária de Relações Internacionais da Contraf-CUT e funcionária do Santander, “O encontro mostrou que precisamos intensificar nossa luta contra as terceirizações e as contratações fraudulentas, que precarizam o trabalho e reduzem direitos. Além disso, é urgente aprofundarmos o debate sobre os impactos da inteligência artificial, que já vem substituindo postos de trabalho na nossa categoria. Essa realidade traz prejuízos não apenas para os bancários, mas também para toda a sociedade, porque reduz arrecadação de impostos, enfraquece a Previdência e compromete o retorno social que deveria ser garantido pelo sistema financeiro. O Santander não pode continuar crescendo às custas da exploração dos trabalhadores e da retirada de direitos.”

 A fraude nas contratações do Santander

O encontro iniciou com a economista e técnica do Departamento Intersindical de Estatística e Estudos Socioeconômicos (Dieese), Vivian Machado, fazendo uma análise econômica e dos dados do Santander. Na conjuntura nacional, ela destacou os resultados do Produto Interno Bruto (PIB) brasileiro, que cresceu 3,4% em 2024, e os dados do mercado de trabalho, que alcançou a menor taxa de desocupação e o maior rendimento médio mensal na sequência histórica.

Apesar dos dados positivos, a economistas lembrou que a taxa de juros (Selic) chegou a 15%, mesmo com uma inflação em 5,35% (acumulada em 12 meses, em junho de 2025). “Com isso, o Brasil chegou ao segundo lugar no ranking de juros reais no mundo, com o maior nível desde junho de 2006”, afirmou. O resultado é uma tendência de aumento do endividamento das famílias, com 78,4% das famílias brasileiras endividadas em junho de 2025. Além disso, o mercado de crédito atingiu um dos maiores valores da história, com cerca de 55% do PIB.

Sobre os números globais do Santander, Vivian ressaltou que o banco obteve, no primeiro semestre de 2025, o melhor resultado trimestral e semestral de sua história, com lucro de 6,8 milhões de euros. “Nesse cenário, a unidade brasileira é a segunda maior contribuinte para os resultados, atrás apenas da matriz na Espanha, com lucro de 996 milhões de euros, ou seja, 14,6% do resultado global”, disse. Já o número de agências globais do banco saiu de 2.446, em 2024, para 1.888, em 2025. “Na Espanha foram fechadas 109 agências nesse período. No Brasil, foram encerradas 558 unidades”, acrescentou.

O resultado nacional do Santander também foi positivo no primeiro semestre, com lucro de R$ 7,520 bilhões no Brasil, um aumento de 18,4% em relação ao mesmo período de 2024. Segundo a técnica do Dieese, o crescimento foi impulsionado pela expansão da margem financeira, que subiu 4,4% em 12 meses, puxada pela alta de 11,3% na margem com clientes. Já na comparação trimestral, houve queda de 3,3% na margem financeira, reflexo da elevação das taxas de juros, parcialmente compensada pelos ganhos com clientes.

Vivian também falou sobre os negócios do banco e apontou a tecnologia como impulsionadora dos resultados, já que Santander aumentou os investimentos nessa área e reduziu os gastos com estrutura. “Os dados mostram um aumento 2,4 vezes nas interações dos clientes com o chatbot, por exemplo. Fato que aumentou em 33% as vendas em lojas e diminuiu 24% os gastos nessas mesmas lojas”, exemplificou.

Na sequência, a economista abordou a queda semestral nas despesas em geral do banco e a consequente melhora no índice de eficiência, que chegou em 36,8%, o melhor índice entre os bancos privados. “O banco alega que houve uma mudança de cultura. O Santander seria um banco que saiu do banco, em que a agência passou a ser loja, o gerente passou a especialista e a receita a comissão”, afirmou. Com isso, veio o fechamento de pontos de atendimento. Por outro lado, entre 2019 e 2024, o número de trabalhadores no Brasil cresceu 16,4%, passando de 47.819 para 55.646. No mesmo período, as despesas de pessoal do grupo caíram 4,1%. E a despesa média por trabalhador diminuiu 17,6%.

“Ou seja, a ampliação do número de trabalhadores no banco Santander se dá fora das agências tradicionais e da categoria bancária. O banco adotou uma estratégia de transferência de trabalhadores do banco para empresas coligadas e controladas”, disse. Atualmente, o Santander Brasil tem participação em 20 empresas, todas elas classificadas em segmentos fora do ramo financeiro. E obteve resultado de R$ 3,7 bilhões, no primeiro semestre de 2025, com essas empresas.

Para finalizar, a economista listou os impactos dessa transferência de trabalhadores promovida pelo banco. “Para os trabalhadores, há precarização nas relações de trabalho, menores remunerações, flexibilização e fragmentação da categoria e prática antissindical que infringe a liberdade sindical e a proteção ao Direito Sindical. Já para a sociedade, há redução do efeito multiplicador da renda, com impacto no consumo e na economia local, e queda na arrecadação do Imposto de Renda, do Fundo de Garantia (FGTS) e no INSS”, encerrou.

Os impactos da IA no sistema financeiro

O segundo debate do Encontro Nacional foi realizado pelo cientista político e professor da Faculdade 28 de Agosto, Moisés Marques, que fez uma análise de conjuntura com o tema “o mundo de ‘ponta cabeça’ e as consequências para o Sistema Financeiro Nacional (SFN)”. Para começar, o professor destacou dois pontos principais neste debate: a fragmentação econômica e financeira e as transformações tecnológicas e seus riscos globais.

No cenário internacional, ele apontou alguns fatos importantes, como a mudança do papel da China no cenário internacional, a possível estagflação nos Estados Unidos, com possibilidade de uma grave crise econômico-financeira, a crise das instituições de governança globais do pós-guerra, a aceleração da transição demográfica e das mudanças ambientais e climáticas e as mudanças oriundas da Inteligência Artificial (IA). “Não podemos deixar de acrescentar a interferência da Gestão Trump em diversas questões globais”, provocou.

Já no cenário nacional, Moisés destacou que a economia tem apresentado dados interessantes e que o Governo Lula começa a ter mais aprovação da população. “O crescimento do País está acima do imaginado, mas a taxa de juros continua alta. Por outro lado, temos a melhor taxa de emprego dos últimos anos, mas Câmara segue criando uma série de dificuldades para o País”, enumerou.

No Sistema Financeiro Nacional, o que se tem visto, ao longo dos anos, é uma drástica redução do número de bancos e o aparecimento dos bancos digitais e das fintechs. “Que são empresas que se dizem bancos, mas não são. Que atuam como se fossem banco e têm tamanho de banco”, ironizou. “Ou seja, as fintechs passaram a ser parte do sistema. Hoje são 1.481 instituições com 100 mil funcionários. Além disso, são empresas que tornaram os processos altamente tecnológicos, sem a necessidade de pessoas”, acrescentou.

O professor também apresentou resultados de pesquisas que mostram o que os bancos querem com a IA, destacando desde a reformulação do setor bancário, a melhora na gestão dos riscos operacionais, a redução dos custos, até o fim dos postos de trabalho. “Diante disso, precisamos refletir sobre os riscos e as questões éticas que estão envolvidas no aumento do uso das tecnologias”, disse.

Para finalizar, Moisés sugeriu como os trabalhadores devem se organizar para enfrentar essa conjuntura: “Precisamos ficar atentos à interconexão entre as grandes questões globais, suas reverberações domésticas e os impactos no Sistema Financeiro. Além disso, precisamos conscientizar a população sobre os resultados dessas mudanças, afinal, o banco do futuro já chegou”, afirmou.

Para ele, é preciso ainda ficar de olho no perfil dos profissionais que estão sendo recrutados e nas formas de contratação, buscar a capacitação dos trabalhadores para lidar com IA e as novas tecnologias, mostrar as vulnerabilidades e os riscos tecnológicos, denunciar os conluios do mercado, participar ativamente das consultas públicas referentes ao setor, ser pedagógico com a população e clientes para alertar sobre as alternativas e acirrar a luta pela regulação do SFN.

ITAÚ

O Hotel Holiday Inn Parque Anhembi, em São Paulo, recebeu nesta sexta-feira (22) o Encontro Nacional dos Funcionários do Banco Itaú-Unibanco. O evento reuniu 86 dirigentes sindicais e representantes de base de diversas regiões do Brasil para debater temas estratégicos, como o cenário político e econômico, os impactos da inteligência artificial na atividade bancária e questões relacionadas à saúde e às condições de trabalho.

A abertura foi conduzida pela Coordenação da Comissão de Organização dos Empregados (COE) do Itaú-Unibanco e por integrantes do Comando Nacional dos Bancários, que ressaltaram a importância da unidade e da organização da categoria diante dos desafios atuais.

Na análise de conjuntura, a presidenta da Federação dos Trabalhadores do Ramo Financeiro do Rio de Janeiro (Federa-RJ), Adriana Nalesso, destacou que a tecnologia deve estar a serviço da sociedade e dos trabalhadores. “A tecnologia tem que servir em prol da classe trabalhadora, para garantir mais qualidade de vida. Para isso, vamos fazer o que sabemos: lutar, resistir e avançar”, afirmou.

Adriana também relacionou o atual cenário internacional com a disputa pelas riquezas da América Latina, lembrando que “a reforma trabalhista, o ataque aos direitos e a tentativa de enfraquecer a Convenção Coletiva (CCT) têm ligação direta com os interesses do capital financeiro e das grandes corporações”.

A presidenta da Federação dos Trabalhadores em Empresas de Crédito de São Paulo (Fetec-SP), Aline Molina, reforçou que a disputa vai além de uma guerra comercial. “Está em curso um movimento de dominação sobre as riquezas da América do Sul, que hoje detém o novo ouro do mundo. Ou lutamos contra o imperialismo ou não teremos condições de trabalhar e viver com dignidade”, alertou.

Segundo Aline, o próximo período será decisivo para o futuro da categoria e do país. “O ano que vem é o ano das nossas vidas. Nossa soberania está verdadeiramente ameaçada, e precisamos reafirmar a luta de classes, combater o imperialismo e construir uma sociedade justa e igualitária para todos”, disse.

Ao longo do encontro, dirigentes ressaltaram que os bancos têm tentado fragmentar a Convenção Coletiva de Trabalho (CCT) para concorrer com fintechs, e que será necessário ampliar a mobilização para preservar conquistas históricas da categoria.

Tecnologia e inteligência artificial: impactos no emprego e no futuro do trabalho bancário

Na sequência, o encontro contou com a participação de Cátia Uehara, economista e técnica da subseção do Departamento Intersindical de Estatística e Estudos Socioeconômicos (Dieese) junto ao Sindicato dos Bancários de São Paulo, que apresentou a palestra “Inteligência Artificial e o Banco Itaú-Unibanco – impactos na Atividade Bancária”.

Cátia analisou as transformações recentes no setor bancário brasileiro, com foco no Itaú Unibanco, impulsionadas pelo avanço tecnológico e pela inteligência artificial (IA). O estudo mostrou o crescimento acelerado das transações digitais, o investimento massivo em tecnologia e a consequente mudança no perfil do emprego, com destaque para o aumento expressivo das ocupações em TI e a redução dos postos de trabalho bancários tradicionais.

Segundo os dados apresentados:

  • O volume de transações bancárias no Brasil superou 200 bilhões em 2024, um crescimento de 8% em relação a 2023, impulsionado pelo mobile banking. Enquanto globalmente o orçamento em tecnologia dos bancos cresceu 35% entre 2018 e 2023, no Brasil o aumento foi de 97% no mesmo período. A participação das ocupações em TI nos bancos privados saltou de 2,7% em 2013 para 12,8% em 2024, chegando a 20% do total de empregados no Itaú.

O Itaú Unibanco, que conta hoje com 17,3 mil funcionários em TI, criou em abril de 2025 o Instituto de Ciência e Tecnologia Itaú, reunindo 80 pesquisadores em projetos de inteligência artificial generativa e computação quântica, em parceria com instituições como Stanford, MIT e USP.

Ao mesmo tempo em que investe na digitalização, o banco tem reduzido sua estrutura física. Entre dezembro de 2014 e junho de 2025, foram fechadas 2.031 agências no Brasil, uma média de 3,5 por semana. No último ano, o Itaú encerrou 223 unidades, enquanto o Bradesco fechou 342 e o Santander 561. Desde 2018, o sistema financeiro brasileiro perdeu 4.853 agências, uma redução de 23,3%.

Essa reconfiguração do setor impactou fortemente o emprego. O Itaú chegou a ter 104 mil trabalhadores em 2009, mas em junho de 2025 o quadro era de 85,7 mil — uma queda de 18,2 mil postos em 14 anos. Em 12 meses, até o fim de 2024, a holding registrou 1,6 mil cortes no Brasil, compensados apenas parcialmente pelo aumento de 1,1 mil vagas em tecnologia.

Os efeitos são ainda mais visíveis no conjunto do ramo financeiro:

  • Em 1994, os bancários representavam 80% dos empregos do setor; em 2024, a participação caiu para 42%.
  • De 2012 a 2024, a categoria bancária perdeu 88,8 mil postos de trabalho, enquanto segmentos como securitários (+88 mil) e cooperativas de crédito (+80 mil) expandiram.
  • Desde 2013, mais de 90 mil vagas bancárias foram eliminadas, com saldos anuais negativos recorrentes.

Apesar dessa redução no quadro de pessoal e do fechamento de agências, os lucros dos grandes bancos seguem em alta. No primeiro semestre de 2025, os três maiores bancos privados somaram R$ 41,6 bilhões, com crescimento médio de 19,8%. O Itaú foi o destaque, com alta de 33,7% em relação ao mesmo período do ano anterior, atingindo R$ 22,1 bilhões.

“Estamos diante de um paradoxo”, avaliou Cátia. “De um lado, um investimento recorde em tecnologia e um discurso de modernização; de outro, o encolhimento das agências, a redução de empregos e a intensificação do trabalho. É fundamental que esse debate esteja no centro da mobilização sindical, para que a inovação não signifique perda de direitos, mas sim melhoria da qualidade de vida dos trabalhadores.”

Painel de Saúde expõe práticas abusivas de gestão no Itaú e seus impactos na vida dos trabalhadores

No período da tarde, o encontro contou com o Painel Saúde e Condições de Trabalho, conduzido por Mauro Salles, secretário de Saúde da Contraf-CUT. A apresentação trouxe à tona dados preocupantes sobre as práticas de gestão do Itaú-Unibanco, que configuram um verdadeiro “mecanismo adoecedor”, marcado por vigilância excessiva, cobrança abusiva e impactos diretos na saúde mental e física dos bancários.

Entre os principais fatores apontados estão: metas inatingíveis, avaliações injustas, estímulo ao individualismo, reestruturações constantes, jornadas estendidas, assédio moral e monitoramento digital invasivo. Segundo Mauro, o uso de algoritmos e ferramentas de controle cria um ambiente de pressão contínua e mal-estar generalizado.

Um dos exemplos mais emblemáticos é o Programa GERA, que funciona como um sistema permanente de monitoramento e ranking de desempenho. Por meio dele, gestores realizam cobranças em tempo real, inclusive fora do expediente, com supervisores enviando mensagens ou ligações via WhatsApp e plataformas internas. Reuniões diárias expõem os resultados de cada funcionário, intensificando a competição e o constrangimento.

As consequências são reconhecidas por organismos internacionais como a OIT e pelo NIOSH como de alto risco psicossocial: aumento de casos de ansiedade, depressão, crises de pânico e burnout; estresse crônico; insegurança no emprego; isolamento e rivalidade entre colegas; além da sensação de estar sendo vigiado em tempo integral, até durante pausas ou no home office.

Essas práticas, além de violarem princípios básicos da Constituição Federal e da CLT, também ferem normas como a NR-17, a LGPD e convenções internacionais da OIT (nº 155 e nº 190). Mauro lembrou que há precedentes na Justiça que reconhecem o caráter abusivo dessas práticas, como o processo nº 0066500-61.2005.5.02.0044, no qual o Itaú foi condenado por assédio moral organizacional e cobrança vexatória de metas.

Um ponto destacado foi que a própria lógica algorítmica pode servir de prova contra o banco, uma vez que todos os registros digitais — logs, relatórios de produtividade, notificações automáticas e rankings — constituem a materialidade do assédio, tornando o que antes era invisível em evidência documental.

Como encaminhamento, foram apontadas ações sindicais fundamentais, entre elas:

  • Denunciar formalmente ao Ministério Público do Trabalho e à Auditoria Fiscal do Trabalho;
  • Reivindicar auditoria externa sobre os dados captados pelos sistemas digitais do banco;
  • Negociar a readequação do Programa GERA e limites ao uso das plataformas de monitoramento;
  • Realizar campanhas de mobilização, reforçando que “Não somos robôs. Conectar não é se submeter”.

“O que vemos hoje no Itaú é um modelo de gestão que adoece os trabalhadores. Metas abusivas, vigilância constante e algoritmos que controlam cada clique transformam o ambiente de trabalho em um espaço de medo e pressão permanente. Isso não é inovação, é exploração disfarçada de tecnologia. Nosso papel como sindicato é denunciar, negociar limites e garantir que a saúde e a dignidade da categoria sejam respeitadas. Não somos máquinas, somos trabalhadores com direitos e vamos lutar para preservá-los”, finalizou Mauro.

A coordenadora do Grupo de Trabalho (GT) de Saúde do Itaú, Luciana Duarte, fez um apanhado das negociações do último ano e da mesa de saúde dos trabalhadores entre o Comando Nacional dos Bancários e a Fenaban no período.

COE Itaú cobra transição justa diante das novas tecnologias e respeito ao emprego bancário

Antes de encerrar, os participantes também debateram a pauta de reivindicações específicas, que deverá orientar as próximas mesas de negociação e integrar futuros instrumentos coletivos a serem firmados entre as entidades sindicais e o Itaú-Unibanco.

Para a coordenadora da COE Itaú-Unibanco, Maria Izabel Cavalcanti Menezes, a reflexão sobre o papel da tecnologia foi central. “É importante conhecer as novas inovações tecnológicas, mas elas precisam vir para melhorar o serviço, como ferramenta de auxílio, e não para substituir o trabalhador. Esse é o grande nó. Queremos uma transição justa para o modelo de inteligência artificial, que garanta o emprego bancário, respeite o meio ambiente e assegure trabalho decente, permitindo que os trabalhadores se beneficiem dos ganhos de produtividade”, destacou.

Segundo a dirigente, é fundamental construir propostas que fortaleçam a luta nacional contra os ataques do Itaú, como o fechamento de agências, as demissões, as metas abusivas, a sobrecarga de trabalho e o adoecimento da categoria.

*com informações da Contraf-CUT