De acordo com estimativas, aproximadamente 25% dos negócios no mundo já acontecem por meio da chamada economia digital. Calcula-se que ela vai movimentar US$ 100 trilhões nos próximos 10 anos em todos os segmentos produtivos (…) e que a quase totalidade dos empregos atuais deverá sofrer mudanças em virtude dos avanços tecnológicos. Essa transformação implica uma série de mudanças em termos de produção, distribuição e venda de produtos e serviços. Surgem novos modelos de negócios e hábitos de consumo.
As últimas décadas vivenciaram a passagem de uma economia de domínio físico (manufatureira) para uma economia digital. No topo do ranking das 10 maiores empresas, ao longo do século XX, estavam empresas como US Steel, Standard Oil, International Harvester, General Motors, General Eletric, American Telephone & Telegrafh, Polaroid e Sears. Hoje, estão Apple, Google, Alphabet, Microsoft, Amazon e Facebook, entre outras das áreas de entretenimento, informação e comunicação.
As novas empresas do século XXI não seguem os parâmetros das antigas empresas. Elas possuem modelos híbridos e escaláveis de negócios (isto é, com praticamente o mesmo volume de recursos conseguem incrementar exponencialmente os seus negócios). O uso intenso de tecnologias de comunicação (internet e aplicativos) é uma de suas principais características. As startups estão entre estes novos formatos de negócios.
Um exemplo claro da influência da tecnologia e da digitalização é o setor financeiro. Os bancos digitais e as fintechs têm promovido mudanças importantes no setor, com a expansão do mobile banking e da internet banking.
Mais: a economia digital tem nas moedas virtuais, como o bitcoin, uma forte alavanca de impulso. E esta alavanca torna-se ainda mais poderosa quando, em meados de 2019, o Facebook anunciou sua intenção de criar uma moeda digital, a libra. Esta moeda permitiria transferências instantâneas e gratuitas, servindo de meio de pagamento universal e forma de reserva de riqueza. O Facebook chegou inclusive a anunciar também a criação da Associação Libra, que reuniria parceiros como Mastercard, Visa, Paypal, Uber e Spotify.
Novos negócios
Mesmo no caso do setor manufatureiro, quando se olha para as tendências do futuro, por meio de projetos como a chamada Indústria 4.0, nota-se também o papel decisivo jogado pelas ferramentas digitais. Alguns autores defendem que a Quarta Revolução Industrial, em curso desde 2010, incorpora tecnologias da terceira fase da revolução industrial, ocorrida na segunda metade do século XX (como o computador, o fax, a engenharia genética, o celular, entre outros), mas agrega acentuadamente as tecnologias digitais, físicas e biológicas.
Isto permite o surgimento de novas empresas, linguagens, profissões (assim como conduz a extinção de uma série de outras). A Indústria 4.0 também altera as relações entre as máquinas sobretudopor meio da inteligência artificial.
Nestas novas economia e sociedade, verificam-se novos formatos de consumo, de empresas, hospitais, escolas e cidades, que passam a ser ‘inteligentes’ e conectadas. Entretanto, isso requer um alto nível de desenvolvimento tecnológico, segurança de dados e internet de alta velocidade, entre outros.
Os países centrais, como os Estados Unidos, os países europeus (Inglaterra, Alemanha, França, Bélgica, Holanda, Espanha e Itália, principalmente) e o Japão, possuem tecnologia de ponta que os colocam à frente neste novo mundo. A China, que disputa a hegemonia mundial com os EUA, tem feito investimentos massivos em tecnologias de ponta.
Já os países emergentes periféricos, como o Brasil, estão atrasados nesta transição para a economia digital. Entre as barreiras estão o alto valor dos royalties e de registro de patentes e o baixo investimento no desenvolvimento de pesquisas na área de Desenvolvimento e Inovação, em especial na área de tecnologia da informação.
Desiguais
Há aqueles que apontam que as novas tecnologias da informação e da comunicação (TIC’s) têm contribuído para o aumento da assimetria e a exclusão no processo de globalização econômica, na medida em que a desigualdade impede o acesso e a criação de oportunidades iguais entre os indivíduos.
Muitos entendem que a inclusão digital impõe uma série de desafios à sociedade. Para que o processo de exclusão digital no país diminua, são necessárias que as políticas públicas sejam norteadas pelos seguintes fatores:
- Inserção no mercado de trabalho e geração de renda;
- Melhorar relacionamento entre cidadãos e poderes públicos;
- Melhorar e facilitar tarefas cotidianas das pessoas, o que pode incluir aspectos do item anterior;
- Incrementar valores culturais e sociais e aprimorar a cidadania;
- Difundir conhecimento tecnológico.
Alguns números que ilustram a influência crescente da economia digital dos brasileiros:
As compras on-line estão cada vez mais presentes na vida dos brasileiros. O Sebrae, em parceria com a Consultoria IDC Brasil e a Associação Brasileira de Empresas de Software, destacam que, em 2017, o mercado mundial de tecnologia da informação e telecomunicações (TIC: TI + Telecom) totalizou US$ 3,55 trilhões, sendo US$ 2,07 trilhões (58%) relativos ao mercado de tecnologia da informação, como hardwares, softwares e serviços.
Segundo o relatório do NeoTrust (E- commerce Brasil, 2020), o faturamenteo do comércio eletrônico no país, em 2019, foi de R$ 75,1 bilhões, o que significou um crescimento de 22,7% em relação ao ano de 2018. Estimativas feitas pela empresa Huawei apontam que a economia digital no mundo terá o valor de US$ 23 trilhões daqui a cinco anos, em 2025.
Levantamento do relatório Neotrust, que analisa as informações coletadas pela Compre&Confie, indica que, antes da chegada do coronavírus, havia no Brasil uma expectativa de faturamento de R$ 90,7 bilhões em 2020, um crescimento de 21% em relação ao ano de 2019.
Apesar do avanço da economia digital nos últimos anos e da tendência à sua expansão nos próximos anos, a ainda baixa conectividade dos brasileiros traz preocupações.
Segundo dados da TIinside (2018), apenas 66% da população possui acesso à internet. Um contingente de 58% das pessoas entrevistadas acredita que as novas tecnologias oferecem mais oportunidades que riscos. Isto, apesar de aproximadamente 85% das pessoas que acessam a internet fazerem a conexão diariamente e 84% acharem que é importante proteger os dados e rede. A maioria dos acessos on-line ocorre via smartphone (cerca de 60%).
Efeitos do isolamento social
O mundo tem se esforçado pelo controle e diminuição da pandemia do novo coronavírus. Para evitar o aumento da velocidade da difusão da doença, tem-se recomendado – e eventualmente até tornado obrigatório – o distanciamento social. Desde então, vários países têm decretado o isolamento social, objetivando o “achatamento da curva de transmissão da doença” para evitar a sobrecarga de demanda, considerando a restrita oferta dos serviços públicos e privados de saúde.
A rigor, ante o cenário brasileiro atual, somente as áreas essenciais deveriam estar em funcionamento. As atividades econômicas não essenciais praticamente pararam ou tiveram reduzidas suas operações. Os trabalhadores e trabalhadoras, cujas funções e tarefas podem ser executadas de casa, por meio do home office, tiveram que fazê-lo. Empresas afetadas buscam incrementar suas vendas e negócios online.
O distanciamento social impõe uma série de desafios e mudanças na vida das pessoas, principalmente no que tange à conectividade digital. Os compromissos bancários, como as idas às agências bancárias, que já vinham diminuindo com o acesso à internet, foram trocados pelo uso do internet banking ou pelo uso dos aplicativos de bancos nos aparelhos smartphones. As idas às lojas e aos supermercados para compras de produtos estão sendo trocadas pelas visitas e compras via internet. Os serviços de entrega de produtos, que já vinham num ritmo expressivo de crescimento, tendem a aumentar com a crise pandêmica do coronavírus.
O setor da educação no Brasil (ensino fundamental, médio, superior, entre outros) já vinha apresentando crescimento no número de cursos e alunos na modalidade “ensino à distância – EAD”. Com a pandemia do coronavírus, muitas instituições tiveram que disponibilizar os conteúdos das aulas no formato em EAD (educação a distância) para os alunos do ensino presencial.
Entretanto, esse setor ainda sofre com a dificuldade de conectividade (nem todos os alunos possuem o acesso à internet, baixa velocidade de conexão, entre outros). O segmento esbarra ainda com a falta de experiência de professores e alunos.
O Brasil é um país com vários problemas estruturais. Um deles é a elevada desigualdade social. A má distribuição de renda e de riqueza se reproduz na economia digital, por meio da exclusão digital. Este é um dos maiores desafios a ser enfrentados pelo país neste novo campo da economia.
Jefferson José da Conceição – Professor e Coordenador do Observatório de Políticas Públicas, Empreendedorismo e Conjuntura da USCS. Autor do livro “Entre a mão invisível e o Leviatã: contribuições heterodoxas à economia brasileira”. Editora Didakt, 2019 (407 págs.). Disponível em www.estantevirtual.com.br.
Gisele Yamauchi – Economista.Turismóloga. MBA Empresarial e Industrial pela USCS. Mestre em Arquitetura e Urbanismo pela USJT. Pesquisadora do Observatório de Políticas Públicas, Empreendedorismo e Conjuntura da USCS – CONJUSCS.
Fonte: Rede Brasil Atual