Mídia tradicional costuma festejar alta nas ações e resultados do mercado financeiro, mas nem sempre há motivos para o trabalhador comemorar
São Paulo – Em junho deste ano, a mídia tradicional comemorou o fato de o principal índice da Bolsa brasileira, o Ibovespa, ter alcançado a marca de 100.303,41 pontos no dia 19, maior nível da história até então. Mesmo sendo um recorde apenas nominal, já que, considerando a inflação, a Bolsa ainda não alcançava o nível registrado em 2008, o fato era celebrado inclusive por pessoas que não têm investimentos no mercado financeiro, como se aquilo fosse sinal de novos tempos na economia brasileira.
O clima de celebração da imprensa mudaria um pouco o tom com o passar dos meses, após a saída de investimento de estrangeiros ter se aproximado do recorde da série histórica, iniciada em 1996, para os primeiros oito meses do ano. Ainda assim, há motivos para um cidadão comum comemorar a valorização de ações na Bolsa?
“Muita gente chega para mim e fala ‘você está reclamando do governo Bolsonaro e a Bolsa está acima dos 100 mil pontos, está vendo como está melhorando?’. Mas como eu já lidei com investimentos e consigo fazer uma análise mais sofisticada do mercado, sei que só quem está comemorando é quem tem algo aplicado. A Bolsa é simplesmente o valor das empresas que tem suas ações negociadas. O valor de mercado dessas empresas aumenta quando o lucro delas aumenta, e estes podem aumentar por motivos bons e ruins. Podem aumentar porque economia está pujante, vive um momento maravilhoso, o PIB não para de surpreender para cima, mas não é nosso caso”, explica o engenheiro e ex-banqueiro Eduardo Moreira, em entrevista ao jornalista Glauco Faria, no Jornal Brasil Atual.
Para ilustrar como a subida do mercado de ações não corresponde necessariamente a um período de melhoras para a população, Moreira usa o exemplo do período econômico recente. “Veja as ações dos bancos. Ao longo dos últimos anos, as ações do bancos não pararam de crescer, mas como foi a economia brasileira nos últimos anos? Foi um caos. Os bancos demitiram. As ações subiram porque eles reduziram mão de obra e cobraram taxas muito maiores de juros das pessoas. Ou seja, tiraram dinheiro delas, aquilo que era renda das pessoas mais pobres virou lucro na mão de dezenas de famílias que já são ricas. Isso significa que a economia está boa? Não, só significa que meia dúzia de pessoas tiveram a vida mais fácil”, aponta.
“Olhar para a Bolsa de maneira simplista, achando que é o termômetro da economia, é super errado. Dou um exemplo. Vamos supor que a gente volte para as leis trabalhistas que existiam antes da reforma trabalhista. Vamos supor que essa reforma da Previdência, ao invés de cortar direitos dos trabalhadores, se preocupe em proteger mais o pobre brasileiro que não tem a proteção social que merece. A Bolsa vai cair porque o lucro das empresas irá diminuir, pois parte do dinheiro será usado para pagar mais aos trabalhadores, o lucro vai ser mais bem distribuído. A Bolsa pode cair por um motivo bom”, afirma. “As pessoas não entendem isso e porque não entendem? Porque tem uma mídia forte anexando e atrelando a melhora da economia à melhora da Bolsa, pois são pessoas que lucram com esses movimentos especulativos e querem usá-los para manipular a opinião publica.”
“A Bolsa está mais do que o dobro do que estava em 2014. A gente está numa situação melhor, mais que o dobro, do que em 2014? Nosso PIB está no nível de 2012 e o desemprego está muito maior do que em 2014. A renda real das pessoas está menor do que 2014, mas a Bolsa está duas vezes e meia melhor. Não precisa falar mais nada.”
Confira a íntegra da entrevista abaixo: