A implantação do Estado moderno a partir da Revolução de 1930 abriu caminho para estruturar e buscar o desenvolvimento nacional, o que seria impensável pela tradição liberal do Estado mínimo instalado na República Velha (1889-1930). Entre 1930 e 2016, o Estado moderno conviveu com quatro grandes fases principais, sendo a primeira associada à sua própria implantação, entre os anos de 1930 e 1945.
A segunda fase, transcorrida nos anos de 1946 a 1964, caracterizou-se por sua consolidação institucional, ainda que fragmentada e seletiva nacionalmente, enquanto a terceira fase, caracterizada pela configuração conservadora de sua ampliação massiva, ocorreu entre 1964 e 1984.
A quarta fase, demarcada pela reestruturação e universalização progressista iniciada em 1985 pela transição democrática, chega ao fim com o golpe de 2016.
Desde então, o Brasil assiste ao desenrolar de uma quinta fase do Estado através da reestruturação autoritária, conservadora e submissa ao exterior. Esse movimento advém de três vertentes distintas, porém com atuações complementares.
De um lado, o viés autoritário das próprias carreiras públicas, a recorrentemente atacar os braços desenvolvimentistas e universalistas do Estado em prol dos seus próprios interesses corporativos, conforme se generalizam exemplos pecuniários e de privilégios por parte das elites incrustadas nos poderes Judiciário, Legislativo e Executivo.
De outro lado, o conservadorismo das classes dirigentes, a condenar e desmontar as medidas estatais voltadas ao estímulo do desenvolvimento do sistema produtivo nacional, pois cada vez mais sustentadas pelos interesses econômicos do rentismo.
Por fim, a atuação externa conformada pelas grandes corporações transnacionais interessadas tanto nos ativos estatais de suporte ao desenvolvimento nacional como no saque aos recursos naturais.
Para tanto, a articulação entre elites pertencentes às carreiras de Estado com a direção do Estado norte-americano permitiu, por intermédio de operações judiciais, a destruição de grandes grupos econômicos nacionais, públicos e privados.
Dessa forma, a entrega da Petrobras, da Embraer e de outros gigantes nacionais ao capital externo. Além disso, tanto o desmonte das chamadas "campeãs nacionais" instalados em setores estratégicos da economia brasileira (construção civil, agronegócio, indústria e outros) quanto a internacionalização da infraestrutura, dos recursos naturais entre outros.
O governo Temer lançou as bases da quinta fase do Estado brasileiro ao tratar de sufocar o seu próprio funcionamento por meio de cortes orçamentários estruturais (Emenda Constitucional 95, que aprisionou o investimento público não financeiro por 20 anos). Também retomou a privatização do setor produtivo estatal e buscou entregar os ativos nacionais que mais rapidamente poderiam atender aos interesses estrangeiros.
Do governo Bolsonaro, nestes primeiros 100 dias, percebe-se o sentido de pertencimento aprofundado à reestruturação estatal de características autoritária, conservadora e submissa ao exterior. Ela ainda não se apresentou de forma ampla, pois se encontra espremida pelos obstáculos instalados em torno da "deforma" – e não reforma – da Previdência Social.
Por conta disso que o atual embate previdenciário pode se tornar o ponto de inflexão para a continuidade ou não da quinta fase do Estado brasileiro, a que desmonta as estruturas provedoras de bem estar social derivado do acordo político que viabilizou a Constituição Federal de 1988.
Os próximos dias indicarão o quanto está planilhado o caminho do retrocesso ou da própria emancipação histórica nacional.
*Professor do Instituto de Economia e pesquisador do Centro de Estudos Sindicais e de Economia do Trabalho, ambos da Universidade Estadual de Campinas (Unicamp)
Fonte: Rede Brasil Atual