Representantes de organizações brasileiras de direitos humanos realizaram nesta quarta-feira (19) um evento na Organização das Nações Unidas (ONU) para protestar contra a militarização da segurança pública no Rio de Janeiro, decretada pelo governo de Michel Temer, em fevereiro, com previsão de término em 31 de dezembro.
Mônica Benício, viúva de Marielle, uma das participantes do evento, relembrou os questionamentos feitos ao Estado brasileiro durante a sessão do Conselho de Direitos Humanos sobre a intervenção federal no Rio. Venho aqui denunciar o Estado brasileiro e sua incompetência para solucionar o crime político mais grave nos últimos anos. É inaceitável que 190 dias depois esse crime ainda esteja impune", afirmou ela.
A Alta Comissária Adjunta expressou sua solidariedade com a viúva de Marielle e se propôs a estabelecer uma interlocução com o Estado sobre o assassinato da vereadora e a situação dos defensores de direitos humanos no país. "Não toleraremos mais a falsa narrativa de guerra às drogas, que escondem o comprometimento dos agentes do Estado na perpetuação dos arranjos lucrativos do tráfico de drogas e armas. A farsa não se sustentará no nome de Marielle", acrescentou Mônica.
A reunião foi realizada de forma paralela à 39ª Sessão do Conselho de Direitos Humanos da ONU e contou a participação da Conectas Direitos Humanos, Anistia Internacional Brasil, Observatório da Intervenção e a Redes da Maré.
Intervenção sem sucesso
A situação do Rio de Janeiro também foi debatida. Em seu sétimo mês de intervenção federal, já foram 457 operações em todo o estado, sendo 70% em favelas da capital. De acordo com o Observatório da Intervenção, o resultado, em média, foi a apreensão de uma arma por operação e a morte de 103 pessoas.
"O crescimento de operações, que empregam muitos agentes para apreender poucas armas e, raramente, desarticular quadrilhas é marca das políticas do Rio. Políticas de desarticulação e combate à corrupção de policiais não são priorizadas. Os dados oficiais demonstram a incapacidade dos interventores em dar respostas aos crimes contra a vida", afirma Pablo Nunes, coordenador de pesquisas do órgão.
Já Renata Neder, coordenadora de políticas da Anistia Internacional Brasil, criticou dois pontos: as operações militarizadas na guerra às drogas e a Lei 13.491/17 que transfere para a Justiça Militar a responsabilidade de julgar os crimes de militares contra civis.
Na avaliação dela, a falta de políticas voltadas à prevenção, combate e investigação de homicídios é responsável pelas "horas de tiroteios" e violações de direitos humanos no Rio. Ela alerta também para a impunidade que a nova legislação de 2017 resulta.
"Os crimes não estão sendo investigados. Em novembro do ano passado, no Rio de Janeiro, uma operação da Policia Civil com as Forças Armadas resultou em oito pessoas mortas, com indícios de execução. Em maio deste ano, uma pessoa furou uma blitz das Forças Armadas e o soldado atirou pelas costas. Não foi numa operação e o caso não é investigado", lamentou ela.
De costas para a ONU
A especialista da Anista Internacional lembra que, em setembro do ano passado, a ONU fez 246 recomendações ao Brasil através do relatório da Revisão Periódica Universal. O texto trata sobre a situação dos direitos humanos e as medidas adotadas para protegê-los e promovê-los.
Renata lembra que nada foi feito. "Um ano depois desse compromisso feito para reduzir a letalidade dos agentes do Estado, a situação só se agravou. As medidas não foram adotadas. O Estado brasileiro não pode estar no espaço internacional, falar uma coisa e implementar algo diferente", critica.
Já Mônica afirma que, atualmente, o Brasil é um país dominado pelas forças do atraso, dando as costas para a comunidade internacional. "Não à toa que recusou a recomendação da ONU que exigia o direito de Lula concorrer à Presidência. Não à toa que o país ignora sistematicamente as recomendações da ONU para desmilitarizar a polícia", finaliza.
Fonte: Rede Brasil Atual